O Susto da Dssimulada
Márcia Dotto
Visitar os avós era a melhor espera durante o ano, em uma época que a comunicação era através de cartas, as notícias da família demoravam muitos dias para chegar. Era uma alegria quando, depois de 300 km de estrada de chão, chegávamos na “estrada do vovô”, em Derrubadas, interior do Rio Grande do Sul.
Para chegar na casa principal tinha um longo percurso, o chamado estradão, estrada de chão batido, um acesso particular ligado a estrada vicinal. A primeira visita que fizemos, fomos eu, minha irmã e nossa mãe. Eu tinha cinco anos, sou a primeira neta dos meus avós. Eu era uma menina muito curiosa, tudo era novidade, encantador aos olhos de uma criança.
A fazenda era enorme, as plantações de soja pareciam tapetes verdes estendidos à beira da estrada. A lida ou os trabalhos do dia a dia eram: capina para a limpeza de inços na plantação, ordenhar as vacas, tratar os animais e todas as atividades para manter a fazenda. Fomos em período de férias e, como de costume, toda família participava das atividades.
Em um dos dias que estava lá, fui a cavalo com meu tio onde estavam o vovô, outro tio e alguns empregados capinando entre a plantação, perto da casa principal.
Como eu era pequena, fui como companhia do meu tio, mas logo que cheguei, quis voltar para casa e meu tio comentou: — Espera um pouco, logo voltaremos! Mas, eu insisti:
— Tio deixa eu ir sozinha a cavalo e ele perguntou: — Você sabe andar a cavalo e, imediatamente, respondi que sim, porque de fato, eu sabia. Então, meu tio me colocou sobre a cela do cavalo e eu mais que depressa, pela alegria de mostrar minha habilidade, fiz um pedido: — Tio, tio, tio, me dá uma varinha para eu tocar o cavalo!
Mas ele falou que não era necessário, que o cavalo era treinado e quando ele desse o comando o cavalo iria até a casa sem necessidade de bater. Foi dado o comando, que foi um estalar de lábios como um beijo e o cavalo começou a caminhar tranquilamente pela estrada.
Aquele movimento parecia muito lento, comecei a chacoalhar os braços e quando eu menos esperava, o cavalo (que participava de carreiras) disparou. O movimento dos meus braços provocou a disparada. Cai não cai, eu me mantive em cima da cela, grudada nos arreios.
Quando estava perto da casa, minha avó, que viu o barulho do trote, saiu da casa e fez o som onomatopaico: xiiiiiii, e o cavalo parou abruptamente. Obviamente, eu voei de cima do animal, caindo na grama em frente da casa. Levantei-me rapidamente, ilesa, sentindo o coração saindo pela boca. A vovó e minha mãe me deram água, me acalmaram e tudo ficou bem.
Mais tarde, quando todos se reuniram para o almoço, meu tio olhou para mim e exclamou, em tom de provocação: — Cadê a cavaleira que caiu do cavalo? Eu, com meus cinco anos de idade, respondi de pronto: — Eu não caí do cavalo, só queria dar um susto nas mulheres!
Foi motivo de muitas risadas e, até hoje, é assunto nas reuniões de família, quando brotam as histórias e peripécias de cada um.
Márcia Dotto é Corretora de Imóveis e aluna da Escola de Criação Literária da Academia de Letras de Balneário Camboriú.