A LEITURA EXPLICA O BRASIL

by Loredana Di Lucchio

Quando me apresento como escritor, percebo algumas reações nas pessoas: de admiração e de estranheza porque, muitas delas acham que eu deveria ter ido para outra profissão. Cursei quatro faculdades, fui alto executivo, diretor de empresas e empresário, mas o que sempre me deu prazer foi a literatura. Ser escritor ainda é ser diferente porque a literatura é uma prática não estimulada nos lares brasileiros.

Há outra reação engraçada: As pessoas contam suas proezas de escritas no tempo de colégio e depois acabam confessando que tem alguma coisa escrita e que sonham em vê-la publicada. Nesse momento,  parece que eu me transformo em soluções para quem quer se tornar um escritor e eu me sinto o gênio da lâmpada que realiza sonhos. Depois que ingressei na Academia de Letras, a reação é essa: Como se faz para entrar na Academia de Letras? Então, explico que, além de outros quesitos, a candidatura requer autoria de livro de qualidade, devidamente registrado no ISBN. A pergunta subsequente é: é muto difícil escrever um livro? Respondo que um bom escritor é sempre um bom leitor. Quem não lê não sabe escrever. Que a leitura de livros faz com que o leitor armazene ideias, imagens, estilos em sua mente e que, automaticamente, ganha-se vocabulário e aprende-se ortografia, pontuação, etc. O resto é ficar atento à realidade e se deixar levar nas asas da imaginação.

Uma vez, o renomado professor de literatura, Rodrigo Gurgel,  ao proferir uma palestra aconselhou: “Se você quer escrever contos, leia muitos livros de contos e se quer escrever poemas faça o mesmo”. Esse é o segredo, ler é o caminho para conteúdo de boas conversas e para você escrever bem.

Essa é uma verdade revelada nas provas de redação do ENEM. No último, de  três milhões de inscritos, comente 12 conseguiram a nota máxima em redação. É fácil entender o porquê. Nos últimos quatro anos, o Brasil perdeu 7 milhões de leitores e a média nacional é de 3,96 livros em partes por ano, a média de obras completas, por sua vez, não chega a 1 — é de 0,82, enquanto na Europa e nos Estados Unidos, o percentual gira em torno de 10 a 12 livros inteiros por ano. O Sul, diferentemente do que muitos acreditam, perde em dobro para o Nordeste.

Vocês perceberam que escrevi que o Brasil perdeu leitores, né! Não escrevi eleitores, melhor tivesse sido. Nessa esteira, o Prêmio Nobel de Literatura, Mário Vargas Llosa, afirmou que “um público comprometido com a leitura é crítico, rebelde, inquieto, pouco manipulável e não crê em lemas que alguns fazem passar por ideias”.

A última pesquisa do Instituto Pro-Livro, revela que 53% dos brasileiros não leem livros. A pesquisa revela que 29% da população brasileira é de analfabetos funcionais e que apenas 34% dos brasileiros alcançam  o nível elementar de alfabetismo. Pasmem! Até mesmo, entre aqueles com alto nível de escolaridade, com ensino superior ou mais, 12% são analfabetos funcionais e 38% dos estudantes universitários não dominam habilidades básicas de leitura e escrita, sendo considerados analfabetos funcionais. Assim mesmo, o consagrado poeta, Mario Quintana, escreveu que: Os verdadeiros analfabetos são os que aprenderam a ler e não leem”.  

Ora, se as pessoas são o que elas leem, isso explica o Brasil e a qualidade dos seus eleitores. Essa realidade, me motivou, como presidente da Academia de Letras de Balneário Camboriú, a abrir diversos Clubes de Leitura e Escola de Criação Literária, na cidade. E mais, promoveremos ciclos de conferências, debates e palestras pela nossa cidade e região. Surfo nas águas dos versos de Castro Alves: “Oh! Bendito o que semeia Livros | livros à mão cheia | E manda o povo pensar! | O livro caindo n`alma | É germe que faz a palma | É chuva que faz o mar”.

Eudes Moraes é Presidente da Academia de Letras de Balneário Camboriú.

PAIXÕES DE INFÂNCIA

* Eudes Moraes

A nossa idade girava na faixa dos dez a doze anos de idade.

Nos tempos dos primeiros bancos escolares, os meninos se apaixonavam por meninas, que nem sempre sabiam que estavam namorando.

O colégio que estudei era dos mais importante em sua época. Os meninos, em sua maioria, vinham de famílias de classe média alta e ricas. As meninas eram delicadas e lindas.

E o desejo pelo sexo oposto se despertou.

Funcionava assim. No meu caso, menino pobre, bolsista em colégio particular, a timidez e o bulling, não me conferiam o direito da iniciativa da escolha. Os meninos ricos escolhiam e dividiam as meninas.

Lembro-me, como se fosse hoje, que tudo acontecia na hora do recreio, entre mordidas nos sanduíches e goles rápidos nos refrigerantes. Os meninos se encontravam no pátio e dividiam as namoradas. Um deles foi logo dizendo que estava namorando a Silvinha e dois outros contestaram, reclamando para si a mesma namorada. Houve um acordo e o mais forte e persuasivo a levou, restando aos demais novas escolhas. De repente, ocorreu nova divisão e todos foram se acertando. No meu silêncio, vi quando a minha primeira escolha me foi subtraída. Acho que a segunda opção também se foi. A verdade é que acabei ficando com a que sobrou. E assim, transcorriam as conversas:
__ Então, tá! Eu namoro a fulana, você a sicrana… e…

E assim, todos se acertaram e, no final, me disseram: Você fica com a Mariazinha.
__ Tá bom! Concordei.

De vez em quando, alguém errava o nome da sua namorada e saiam na porrada. O bedel levava todos para a diretoria.
—- É que ele roubou a minha namorada! Era a alegação.

O diretor devia se divertir com essas ocorrências!

Quantas vezes, eu também quis trocar a minha e avançar nas namoradas dos outros, mas, bolsistas não podiam se envolver em brigas e nem serem chamados na diretoria.

Essa foi a minha primeira experiência com a paixão. Mas, ninguém se apaixona aos dez anos, dirá você. Puro engano! Se ela é um coisa gostosa que invade o peito, provoca a imaginação, dá uma sensação de prazer e dispara adrenalina, só pode ser paixão. Existe sim, embora tenha sido sonho infantil!

Lembro-me o nome completo da menina que despertou os meus primeiros suspiros de paixão. Claro, que não fui correspondido, mesmo porque ela de nada sabia!

A imaginação é uma área neutra em que tudo é permitido e nada é punido.

Mais tarde, na minha pré-adolescência, eu me encantei com uma prima. Ela era graciosa e quando eu a via desfilando pelas ruas o meu coração sempre batia maus forte. Eu era tímido por ser reprimido pelo meu pai e jamais ousei transparecer esse sentimento, nem para ela. Em todo caso, eu estava bem treinado nessa paixão do faz de conta.

Foi aí que eu senti que precisava trabalhar para ter dinheiro e comprar um presentinho para ela. Pedi para o meu pai fazer uma caixa de engraxar sapatos. Ele relutou um pouco, tentou ver se eu esquecia e diante da minha insistência fabricou o meu instrumento de trabalho. O primeiro dinheiro que ganhei, paguei meu pai em prestações, claro!
Depois, dei algum dinheiro para a minha mãe e comecei a me sentir orgulhoso de mim.

Não resistindo ao impulso do coração juvenil, comprei uma caixinha de pó de arroz, pedi para a vendedora embrulhá-la com papel de presente e uma fita. Eu iria dar para a minha prima, talvez, minha namorada. Sensação gostosa!

Cheguei em casa e não sabia o que fazer com o presente. Fiquei com medo de ser descoberto e do meu pai brigar comigo. Escondi a caixinha embaixo do assoalho da casa e fiquei esperando ter coragem e oportunidade para entregá-la. De vez em quando, quando meus pais saiam, eu a pegava e ensaiava o que eu iria dizer, quando entregasse o presente: — Olha, é pra você ficar mais bonita do que é!

Eu sabia exatamente onde encontrá-la, porque ela sempre se reunia com outras meninas na esquina de casa. Eu ia até o portão e ficava olhando. Elas brincarem de amarelinha. Seus cabelos longos soltos balançavam de um lado para outro. Um dia, eu criei coragem e me aproximei. Estava tremendo. Não podia gaguejar. Não rolou, fraquejei!

O medo foi maior do que a paixão e voltei para casa com a caixinha. Até hoje, ela está escondida embaixo do assoalho da casa, se é que a casa ainda existe e se o pó de arroz resistiu ao tempo!

Hoje compreendo o significado da expressão “pó de arroz”. Se era atribuído aos fracos e medrosos, esse era eu!

Cresci e perdi a conta de quantas paixões e namoros vivi.

Eudes Moraes é da Academia de Letras de Balneário Camboriú e da Academia de Cultura de Curitiba.